Nunca fizemos proteção das florestas, dos rios, dos animais, da biodiversidade porque alguém de fora orientou, recomendou ou pediu que a gente fizesse isso. Isso está na alma, no espírito dos povos indígenas, proteger esses recursos, esses bens que estão muito ligados com a vida. A gente não vive nesses lugares de passagem ou para tirar algum benefício. A gente vive para sempre. Então, a questão ambiental, a questão da biodiversidade, das águas, dos seres que compõem essa natureza, elas todas, juntas, fazem parte da nossa vida.
O líder indígena Francisco Piyãko, dos povos ashaninka do Rio Amônia, em Marechal Thaumaturgo, concedeu entrevista ao Notícias da Hora nesta sexta-feira (19), data em que se comemora o Dia Nacional dos Povos Indígenas. Ele disse que a principal bandeira de luta dessas populações no Acre e no Brasil é a demarcação de suas terras, bem como assegurar a paz dentro delas. Ele falou ainda a respeito da relação com o meio ambiente e necessidade de agenda uma global para frear o aquecimento do planeta.
Na última quarta-feira (17), Francisco Piyãko, coordenador da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ), assumiu como membro do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI). A cerimônia de posse ocorreu durante a 1ª Reunião Ordinária do Conselho, realizada no Salão Negro do Palácio da Justiça, em Brasília, promovida pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI).
FOTO: ARISON JARDIM
Notícias da Hora: A questão das demarcações das terras indígenas tem avançado no País? O que precisa ser feito?
Piyãko: Posso falar algumas questões que são pilares. A questão da terra indígena, que já estão demarcadas, elas devem ser protegidas de acordo com o que está na Constituição Federal. Você não pode ignorar esse direito dos povos indígenas. Àquelas reivindicações de terras que ainda não estão demarcadas também elas têm que ser resolvidas. Essa é uma questão central, que é base. Se não tiver esses territórios já demarcados, protegidos pelo Estado, se não tiver essas terras indígenas reivindicadas demarcadas, sem essas bases a vida fica inviável nesses lugares, com tanto ataque, com tantas ameaças, invasões que pode acontecer. Então, terra indígena é o primeiro ponto que não sai das nossas pautas.
Notícias da Hora: A cultura indígena hoje está ameaçada por diversas questões. O que fazer para reverter isso?
Piyãko: Outra questão muito importante dessa diversidade cultural, com seus valores, com seus modos de vida, com seus conhecimentos tradicionais que estão sendo ameaçados. A gente precisa ter políticas muito claras, que levem em conta o fortalecimento de um processo de educação diferenciada, que está garantida na lei, como a Saúde. Não pode ser feita simplesmente para fazer número ou para fazer de conta que está fazendo algum atendimento ou algum favor aos povos indígenas. Tem que ser de maneira profunda, séria, respeitando esses valores. O Brasil deveria, todos os povos brasileiros, seja onde você esteja, deveriam se orgulhar muito desses valores que muitos países já perderam. Nós reivindicamos isso sempre e isso não vai sair da nossa luta para continuarmos existindo como somos, não nos importamos se trazemos meios tecnológicos, traga conhecimento de fora, mas que isso seja para proteger e fortalecer os nossos povos.
Notícias da Hora: Os povos indígenas tem mandado um recado claro ao mundo da necessidade de preservação do Meio Ambiente...
Piyãko: Outra questão é a questão ambiental. Nunca fizemos proteção das florestas, dos rios, dos animais, da biodiversidade porque alguém de fora orientou, recomendou ou pediu que a gente fizesse isso. Isso está na alma, no espírito dos povos indígenas, proteger esses recursos, esses bens que estão muito ligados com a vida. A gente não vive nesses lugares de passagem ou para tirar algum benefício. A gente vive para sempre. Então, a questão ambiental, a questão da biodiversidade, das águas, dos seres que compõem essa natureza, elas todas, juntas, fazem parte da nossa vida. São fundamentais para a nossa vida. E está todo mundo hoje, no Mundo inteiro, sentindo que estivemos sempre certos na nossa relação com a natureza. Os impactos questão causando com o aquecimento global é exatamente uma questão que compreendemos há muito tempo de que o desrespeito ao meio ambiente, com essa mãe natureza, nós vamos todos pagar um preço muito alto.
Notícias da Hora: O que é preciso avançar tanto no Acre quanto em âmbito nacional?
Piyãko: O que precisa avançar tanto no âmbito nacional quanto no estado do Acre é ter uma relação mais séria. Não é nem os povos indígenas e nem as florestas, nem as riquezas que compõem toda a nossa Amazônia, as nossas casas, os nossos territórios, eles ao têm que ser vistos como produto, como mercadoria, como algo para crescer economicamente. Esse lugar é o equilíbrio da humanidade. É mais profundo do que isso. Os governantes precisam entender que nós não podemos ser meio para alguém ter lucro. Estou falando de nós gente, nós povos indígenas, nós cultura. Estou falando de nós Amazônia, de nós biodiversidade, dos nossos valores. Isso não pode ser visto como meio para alguém ter lucro. Isso tem que ser respeitado. Na medida, dependendo de como você olha, as pol´tiicas públicas não vão atingir com profundidade, atingir aquilo que a gente quer. É preciso que a gente bote limite nas coisas. A Constituição tem isso claro. A implementação disso é que é tratado como se fosse atraso. É contra o desenvolvimento, é contra a economia. Não é isso. Acho que o atraso não está nos povos indígenas, não está na Amazônia, nesse bioma amazônico, dos povos da floresta. O atraso está na interpretação que se faz dos valores que ali tem, da importância que aquilo tem para a vida. As pessoas querem vender, querem destruir aquilo para trazer outros valores para estes lugares.