Em um mundo onde a velocidade da informação supera a capacidade de análise, a justiça se converte em um tribunal midiático. O filósofo Zygmunt Bauman, ao descrever a "modernidade líquida", alertava para a efemeridade das relações e das verdades, onde nada se solidifica o suficiente para permitir um julgamento justo e ponderado. Já Norberto Bobbio, ao falar sobre o papel das instituições democráticas, enfatizava que a justiça deve ser regida pelo direito, não pela emoção de massas voláteis. Mas na era das redes sociais, o que prevalece é a execração pública instantânea, muitas vezes sem provas, sem julgamento e sem defesa.
O caso da mulher assassinada na Cidade do Povo, em Rio Branco, ilustra essa realidade de forma brutal. A base da execução? Rumores, fofocas, um tribunal invisível que a condenou sem qualquer averiguação dos fatos. Acusada de matar a própria filha de três meses, teve sua vida ceifada por justiceiros urbanos que se guiaram por uma histeria coletiva, não por evidências concretas.
Da mesma forma, a prisão do jornalista Willamis França demonstra outra face desse tribunal midiático. Supostamente vitimado por uma falha processual, França foi detido sem que houvesse uma compreensão exata dos fatos. Bastou a manchete para que sua reputação fosse triturada e a opinião pública se dividisse entre a indignação e o escárnio, sem qualquer consideração pelos trâmites legais.
Vivemos, como alertou Guy Debord em "A Sociedade do Espetáculo", uma era em que a imagem se sobrepõe à realidade. Não importam os fatos; o que vale é o que causa impacto, o que mobiliza emoções e reforça narrativas pré-concebidas. O tribunal da internet não busca a verdade, mas sim um culpado conveniente.
O que nos resta, enquanto sociedade, é a reflexão: até quando a justiça será feita a golpes de cliques e execrações públicas? O estado de direito, como bem colocou Bobbio, deve prevalecer sobre a barbárie. Caso contrário, seremos reféns de um ciclo infinito de justiça pelas próprias mãos, onde qualquer um pode ser o próximo condenado da vez.
Tácio Júnior é jornalista, pela Universidade Federal do Acre, e assessor parlamentar