Em minha vaga memória, recordo-me de que Aluízio Bezerra estava trajando uma camisa azul-celeste, cultivava um bigode ligeiramente avolumado e tinha um rosto arredondado, com uma leve tendência à calvície. No aspecto intelectual, era um exímio orador e tinha um discurso empolgante, característica de alguém com um perfil de estadista. Era um showmício – o primeiro que eu assistia – nos idos de 1996, na Vila Santa Luzia, zona rural de Cruzeiro do Sul. Ele disputava a eleição para prefeito, depois de ter perdido a reeleição para o Senado, em 1994, para a então jovem deputada estadual Marina Silva.
Eu, ainda criança, com aproximadamente seis anos de idade, daquele momento em diante, comecei a familiarizar-me com a política partidária e institucional, passei a acompanhar showmícios amiúde. Com o passar do tempo, alguns termos foram se introduzindo na minha consciência como essenciais para qualificar um grande político: humanista, democrata, estadista. E alguns outros termos aprendi que são imprescindíveis para definir o que se deve exercer com a prática política: ética, democracia, justiça social.
Quatro anos depois, ele disputava a reeleição. A partir de então, tenho uma lembrança mais sólida. Havia três concorrentes. Em uma disputa apertada, perdeu a eleição para o então deputado estadual César Messias, do antigo PPB. Este obteve o apoio do também deputado estadual peemedebista, Vagner Sales, contrariado por ter sido preterido na convenção do PMDB para a escolha do candidato à Prefeitura. Esse fator, dizem, foi determinante para a derrota de Aluízio, dada a pequena margem de diferença de votos. Os outros concorrentes eram Osmar Bandeira, do PSDB, apoiado pelo PT e Carem Carvalho, do nanico PMN.
A partir de então, Aluízio nunca mais iria se reinserir diretamente na política. Radicou-se em Brasília e com a velhice vieram também sucessivos problemas de saúde, que o deixaram bastante debilitado, em cadeira de rodas. Costumeiramente, recebia visitas de políticos acreanos em sua residência. Sua esposa, Zila Bezerra, também saiu peremptoriamente da vida pública, depois de ter sido deputada federal e prefeita de Cruzeiro do Sul.
Apesar de ser cruzeirense nato e ter tido forte participação na política local, era no cenário nacional que o político ganhara destaque de 1979 a 1994, período em que foi duas vezes deputado federal e uma vez senador da República. Compôs a ala histórica do PMDB, e opôs-se fortemente à ditadura militar, ao lado de Ulysses Guimarães, Jarbas Vasconcelos, Pedro Simon e outros próceres do partido que foi símbolo de resistência democrática. Quando congressista, votou pelas Diretas Já, medida que previa eleições diretas para presidente da República e, no Colégio Eleitoral, votou em Tancredo Neves, contra Paulo Maluf, que representava o establishment político.
Enquanto parlamentar, foi o autor da emenda constitucional e de toda a legislação ordinária seguinte que permitiu a aposentadoria e o pagamento de outros benefícios aos ex-seringueiros e seus familiares conhecidos como “Soldados da Borracha”. Outra bandeira que empunhou, talvez a mais expressiva, foi a da construção da Rodovia Transcontinental, que ligaria o Acre ao Peru. Esta última, até hoje, não se concretizou.
No plano local, quando foi prefeito, enfrentou a oposição ferrenha do então vereador Henrique Afonso. Combativo, professor e ex-sindicalista, Henrique liderou movimentos populares e manifestações que culminaram em sucessivos afastamentos de Aluízio da cadeira de prefeito. Mas, habilidoso que era e bem relacionado com diversas instâncias de poder, sempre dava a volta por cima e retornava ao cargo. Controvérsias à parte, sua gestão foi marcada por investimentos maciços em quadras poliesportivas e postos de saúde.
Aluízio era advogado com doutorado na renomada Universidade Sorbonne, na França. Apesar do grande capital intelectual, do currículo invejável e de uma carreira vitoriosa, o político adicionou traços de polêmica e incoerência em sua biografia. Mas esses são elementos que não fazem parte dessa singela homenagem, até porque são incapazes de apagar a opulência desse grande juruaense, que ficará marcado na memória política do Acre e do Brasil.