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ARTIGOS

Por um Serviço Florestal do Acre

Por um Serviço Florestal do Acre

Temos 85% do território do Acre ocupado com florestas, e o setor florestal respondeu por 58% das exportações acreanas em 2021. Somente com madeira e seus derivados e a castanha, obtemos neste período mais de US$ 28,5 milhões, números que vão se repetindo em 2022 e que colocam a exportação de produtos florestais à frente de outras commodities agropecuárias.

Dado a sua relevância, e o potencial que a economia florestal tem para contribuir com o desenvolvimento econômico do Acre, era de se esperar que houvesse uma instituição voltada para implementação de políticas para o setor. Infelizmente, não há. Até 2012, tivemos a Secretaria de Estado de Floresta (SEF) cumprindo esse papel, mas acabou sendo extinta e tendo suas atribuições incorporadas às áreas de indústria e comércio e depois ao meio ambiente. Mesmo assim, é fato que seu legado persiste até hoje em nossa pauta de exportações, no apoio ao ensino da engenharia florestal e nas inovações que ocorreram no setor.

Agora, olhando para o futuro, os estados da Amazônia que modernizaram a gestão florestal criaram órgãos específicos para tratar do tema. Porém, o melhor exemplo vem do governo federal, que em 2006 separou a gestão florestal da gestão ambiental, criando o Serviço Florestal Brasileiro (SFB).

Hoje, o SFB é responsável por mais de um milhão de hectares de áreas de concessões florestais, pelo cadastro ambiental rural e pela estratégia nacional de apoio a regularização ambiental dos imóveis rurais perante o Código Florestal. Destacamos, porém, que foi através dele que, pela primeira vez, o setor florestal legal da Amazônia teve voz e presença nas instâncias do governo federal.

Partindo destes exemplos, por que entendemos que é importante termos um "Serviço Florestal" para o Acre?

Em primeiro lugar, considerando que o Acre dispõe de 85% de cobertura florestal é necessário garantir a governança sobre nossos recursos madeireiros e da biodiversidade. Dados do Zoneamento Ecológico-Econômico demonstram que temos potencial para realizar o manejo florestal em mais de 6 milhões de hectares em terras públicas e privadas. Avançar nessa direção produziria impactos econômicos significativos, tanto na renda dos proprietários rurais, incluindo famílias e comunidades tradicionais, como na garantia de suprimento para as indústrias locais.

Segundo, há várias regulações aplicadas às florestas no Brasil, como o Código Florestal, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, a Lei de Gestão de Florestas Públicas e as recentes normativas sobre o mercado de carbono que demandam aos estados a existência de infraestrutura e recursos humanos específicos para a sua operacionalização.

Terceiro, temos um mercado relevante de madeira e demais produtos extrativistas (castanha principalmente), além da ascensão da bioeconomia como oportunidade para avançar na valorização da biodiversidade. Reestabelecer a liderança, representatividade e participação nas principais discussões sobre esses temas é estratégico para obter os benefícios que se apresentam no Brasil e no mundo.

Exemplo disso é o interesse crescente das empresas em investir na conservação e restauração de florestas e geração de créditos de carbono através das suas estratégias de ESG (práticas ambientais, sociais e de governança). Sairá na frente quem dispor de infraestrutura governamental adequada para facilitar e garantir segurança jurídica e incentivos para investimentos dessa natureza.

Quarto, há desafios persistentes a serem vencidos pelo setor florestal acreano, tais como: a atualização e regulamentação de leis e normativas; a irregularidade do volume produzido a partir de áreas manejadas; a falta de agregação de valor à madeira e aos produtos da biodiversidade; a baixa produtividade da indústria florestal; dificuldades de acesso à crédito; carência de mão-de-obra para a indústria de transformação, negócios e mercado; baixa integração universidade-empresa-governo; investimentos insuficientes na inovação florestal; burocracia e defasagem dos processos e sistemas administrativos; baixa transparência e  rastreabilidade da origem do produto florestal; dificuldades de comunicação e transmissão de dados em regiões de difícil acesso; e, dificuldades de inclusão socioeconômica e garantia de direitos de povos e comunidades tradicionais.

São problemas que não serão resolvidos sem uma atuação contundente e especializada de uma instituição que coordene a política pública voltada para a integração, a modernização e o aumento da competitividade da cadeia produtiva florestal acreana.

Finalmente, defendemos que a criação dessa instituição não resultará em aumento significativo do gasto público. Afinal, o estado ainda mantém tanto a infraestrutura advinda da antiga SEF quanto o quadro de engenheiros e técnicos florestais dos mais competentes, capaz de liderar a transição efetiva da estrutura atual para o novo órgão de gestão e produção florestal.

Por isso, consideramos que a criação do Serviço Florestal do Acre, com autonomia, lei orgânica e plano de cargos e salários próprios é a melhor forma de alcançar a estabilidade institucional, característica estratégica para tratar de atividades que exigem planejamento, execução e monitoramento à longo prazo, como as concessões florestais e o acompanhamento do ciclo de produção das áreas de manejo florestal, que hoje variam de 25 a 30 anos.

Com a atuação desta instituição poderemos mais que dobrar a participação do setor florestal na economia estadual, pois sua estrutura de gestão será mais ágil, inovadora, livre de amarras burocráticas e focada no desenvolvimento de políticas e estratégias de desenvolvimento florestal.

Acreditamos, portanto, que aumentar a participação da economia florestal traria impactos relevantes para o desenvolvimento econômico do Acre, melhorando a conservação e uso dos nossos recursos florestais e da biodiversidade. Para isso, uma instituição que atue como mediadora e parceira do setor privado, promovendo um ambiente favorável aos investimentos florestais de longo prazo seria muito bem-vinda!

Marky Brito é engenheiro florestal (UFRA), com MBA em Gestão de Projetos (FGV), Técnico Especialista do Estado do Acre e atualmente chefe do Departamento de Estudos, Pesquisas e Indicadores da SEPLAG.

João Paulo Mastrangelo é engenheiro florestal (UFAC), Professor de Economia Agrícola da UFAC, com Mestrado em Desenvolvimento Regional (UFAC) e Doutorando em Desenvolvimento Econômico (UNICAMP).

Erilene Lima Silva é engenheira florestal (UFMT), com Mestrado em Socioeconomia Ambiental e Especialização em Práticas de Desenvolvimento (CATIE), Técnica Especialista do Estado do Acre e Cofundadora da Gikitaya Socioambiente.