Pelo menos para ouvir a opinião da ministra Marina Silva sobre o projeto de ligação do Acre com o Peru via Pucallpa o evento Cúpula da Amazônia serviu.
Pressionada pelo jornalista acreano Junior César durante o programa institucional Bom dia, ministra, Marina Silva ficou literalmente “sit on the fence” (em cima da cerca), traduzindo para o português a expressão usada por ingleses para este tipo de postura.
Sem dizer se é a favor ou contra a construção da rodovia, a ministra acreana jogou a decisão de licenciamento para o Ibama. Ignorando o projeto de sustentabilidade em curso pelo governo de Gladson Cameli – que tem como base o fortalecimento do agro – ela expôs sua gênese petista receitando a reativação do plano de desenvolvimento do ex-governador Jorge Viana, baseado no conceito de “Florestania” pensado por um velho amigo da ministra, o jornalista Antônio Alves.
Ao criticar na mesma entrevista o desmatamento da reserva ambiental Chico Mendes como se tais consequências fossem do modelo econômico atual, Osmarina se esqueceu de dizer o que fez como ministra entre 2003 e 2008 para conter a invasão ao que ela chama de “símbolo da luta ambiental do Brasil”. A floresta categorizada como reserva em março de 1990 é administrada pelo Instituto Chico Mendes criado por Marina Silva desde 2007.
Conflito é o que não falta na pasta ambiental do governo Lula. Na contramão do que defende Marina Silva, há uma intensa movimentação política para permitir a exploração do combustível fóssil na foz da Amazônia depois que o Ibama negou licença ambiental ao projeto.
As consequências climáticas de uma possível exploração de petróleo na Amazônia são infinitamente maiores do que a extensão da BR 364 até Pucallpa.
Ao falar nas possibilidades de estudos sobre as viabilidades econômicas, culturais, sociais e tantas outras colocadas para aprovar a construção da estrada entre Mâncio Lima e Pucallpa, a ministra Marina Silva parece sinalizar para um processo de licenciamento lento que não conta com sua motivação para ser aprovado ou desaprovado a curto prazo.
A Cúpula da Amazônia não traçou uma política comum entre os países participantes. Não foram fixadas metas e prazos capazes de frear o aumento da temperatura média global do perigoso ponto de inflexão de 1,5ºC. Há urgência de salvar a floresta e respeitar seus povos, mas não existe um plano, um projeto concreto para dar ao homem que produz essa conservação, dignidade, qualidade de vida.
Em meio a tanta ideologia, entre os anos que separam uma gestão e outra de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática, o que existe de concreto é a compreensão de transversalidade. O plano de combate ao desmatamento envolve 19 ministérios. Por outro lado, promover o crescimento conectado à conservação de recursos naturais parece ser o maior desafio em um planeta cada dia mais quente.
Se criticou tanto, recentemente, um suposto desconvite do Acre para participar de um evento privado sobre mudanças climáticas em Paris. Em meio a tanta indefinição e desconfiança generalizada entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento, não creio que o estado vai perder em não participar do evento. É melhor continuar fazendo o dever de casa.
Entre um gole e outro de cafezinho, são 38 milhões de cidadãos sobrevivendo, como disse o presidente Lula “abaixo das copas das árvores”. Muitas vozes não consideradas quando se trata de pensar o futuro em nome da Amazônia.
Jairo Carioca é jornalista, assessor de imprensa. Escreve semanalmente para o NH.