A respeito dos atos e protestos, que compreendem bloqueios de estradas e acampamentos na porta de quartéis Brasil afora, já havia assinalado, em outras oportunidades, o motivo em virtude dos quais os mesmos não poderiam ser caracterizados como formas de manifestação da liberdade de expressão, mas sim como crimes. Em tempos de fake-news, realidade paralela e pós-verdade, nunca é demais repetir o óbvio:
A liberdade de expressão não é absoluta e nem ilimitada. A livre manifestação do pensamento, prevista no art. 5°, inciso IX, da Constituição Federal de 1988, que compreende o direito ao protesto pacífico, não alberga direito de produzir e difundir fake news, de caluniar, injuriar, difamar, ameaçar e, muito menos, de atentar contra a própria liberdade. Nesse sentido, manifestações que pedem intervenção militar ou federal (portanto, o fim da democracia) não estão protegidas pelo manto da liberdade de expressão. Tais modalidades de intervenção, solicitadas por manifestantes não encontram respaldo no art. 142 da CF/1988 e em nenhum outro dispositivo de nenhum outro diploma legal do ordenamento jurídico pátrio brasileiro. Sendo assim, tais manifestações são antidemocráticas, golpistas e constituem os CRIMES previstos nos arts. 286, parágrafo único; e 359-L, combinados com o art. 29, todos do Código Penal.
Ocorre que os tais bolsonaristas, acampados na porta dos quartéis, que se diziam "manifestantes pacíficos", de há muito já transbordaram suas ilegais súplicas por intervenção para o vandalismo e o terrorismo, como no festival de arruaça levado a efeito por dezenas deles, no dia 12/12, na Capital Federal, bem como no episódio da Bomba de Natal, planejada para explodir nas cercanias do Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília. Nesse caso, além do crime de incitação a abolição violenta do Estado Democrático de Direito, já acima citado, também estão presentes as condutas ilícitas previstas no art. 2°, § 1°, inciso I, da Lei n° 13.260/2013 (Lei Antiterrorismo).
O que mais tem chamado a atenção, porém, é a leniência das autoridades responsáveis por fiscalizar e coibir tais práticas. Conforme assinalou o colunista Reinaldo Azevedo, "foi preciso que uma bomba fosse descoberta num caminhão-tanque para que se efetuasse a primeira prisão em Brasília." Quer dizer que, além do silêncio obsequioso do presidente da República e das pessoas de seu entorno para com a prática desse tipo de conduta, os indícios de prevaricação têm sido sistemáticos, continuados e múltiplos, tanto por parte das FFAA, quanto das polícias.
Afinal, como explicar que todo o "plano" para fabricação e instalação da bomba tenha ocorrido no acampamento de manifestantes em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, sem que nada tenha sido percebido pelos militares? Nesse caso, não há outra alternativa lógica senão concordar com as palavras do futuro ministro da Justiça, Flávio Dino: "os acampamentos 'patriotas' viraram incubadoras de terroristas". E também com as palavras do colunista Luiz Nassif: "o Exército é incompetente ou cúmplice ao não identificar terroristas acampados em frente a seus quartéis."
Não custa nada lembrar que o Exército, a Marinha e a Aeronáutica detém poder de polícia, próprio da administração militar, nas áreas adjacentes aos aquartelamentos, podendo exercê-lo para coibir a prática de ilícitos (crimes ou atos infracionais) que ali ocorram ou estejam na iminência de ocorrer. Por tratarem-se, os locais dos "protestos", de Áreas Militares - como sobejamente indicado nas placas de alerta, afixadas em todo o perímetro de entorno das guarnições - há proteção específica e tratamento jurídico distintos à livre circulação de pessoas e veículos em áreas próximas aos aquartelamentos.
Nos casos em questão, houve não só bloqueios de vias públicas ou dificuldades ao tráfego de veículos, mas também obstrução de acessos aos quartéis, que se somaram aos ilegais pedidos de intervenção. Houve até mesmo a montagem e instalação de barracas, banheiros químicos e cozinhas de campanha, em locais onde sequer é possível estacionar carros, hipótese em que podemos estar diante não somente de infrações legais à legislação militar, por parte dos manifestantes, mas, sobretudo, diante da omissão dos responsáveis por cada uma dessas guarnições.
Todos os fatos têm transcorrido há quase dois meses, sem que houvesse ou haja o respectivo alerta ou reprimenda, por parte do comando dos respectivos quartéis, em claro sinal de conivência, caso em que deve ser apurado o suposto delito de prevaricação, previsto, quando praticado por militares, no art. 235, do Decreto-lei nº 6.227/1944 - Código Penal Militar.
Em resumo, passou da hora de dispersar, recolher os recalcitrantes ao xilindró, punir quem financia tais movimentos e investigar a omissão e a conivência de quem deveria, por dever de ofício, coibir tais práticas criminosas.
*Daniel Zen é doutorando em Direito pela UnB e Mestre em Direito, com concentração na área de Relações Internacionais, pela UFSC. Professor do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas (CCJSA) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Contrabaixista da banda de rock Filomedusa. Colunista do portal de jornalismo colaborativo Mídia Ninja e do site Notícias da Hora. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..