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Artesanato indígena Nukini faz sucesso além das fronteiras brasileiras

Artesanato indígena Nukini faz sucesso além das fronteiras brasileiras

Para chegar ao Recanto Verde, uma das seis aldeias do Povo Nukini, às margens Rio Moa, em Mâncio Lima, são necessárias pelos menos cinco ou seis horas de viagem de barco. Mas o percurso até lá é um mergulho nas belezas e nas riquezas naturais da Floresta Amazônica. A aldeia fica muito próxima da face norte da Serra do Divisor, onde estão as principais cachoeiras e atrativos naturais do Parque Nacional.

No Recanto Verde os moradores se dedicam à agricultura e à recepção de visitantes que querem conhecer a cultura espiritual dos Nukini durante os festivais tradicionais. Mas já há alguns anos parte dos moradores da comunidade estão conseguindo uma renda significativa com o artesanato. Na realidade, essa atividade faz parte da cultura ancestral do Povo da Onça, como são conhecidos os Nukini.

Diferente de outros povos indígenas que utilizam preferencialmente miçangas nas peças artesanais, os Nukini têm dado preferência para os trabalhos com as matérias-primas da floresta. Isso tem despertado a atenção de compradores de várias partes do Brasil e do mundo. Assim, toda a produção artesanal do Povo da Onça tem sido vendida, principalmente para clientes nos Estados Unidos.

A aldeia fica muito próxima da face norte da Serra do Divisor, onde estão as principais cachoeiras e atrativos naturais do Parque Nacional. Foto: Marcos Santos

A qualidade do artesanato sustentável Nukini e o seu potencial comercial chamou a atenção da Agência de Negócios do Acre (Ageac). E começou a ser elaborado um projeto para catalogar as peças e montar um plano de negócios para exportar esse artesanato para outros estados e países.

O diretor-presidente da Ageac, Carlos Ovídio Rocha, acredita que esse processo com a produção artesanal Nukini pode ser um balão de ensaio para investimentos também nas peças de outras etnias indígenas do Acre.

“Em muitos países do mundo o artesanato é uma importante fonte de renda para muita gente. Queremos valorizar o artesanato indígena acreano, porque entendemos que existe um vasto mercado consumidor para esse tipo de produto da floresta. Sem falar que é uma maneira de o governo incentivar novas formas de produções sustentáveis que irão gerar oportunidades e renda para muitos indígenas que vivem no interior e trazer divisas para o estado”, afirma.

Criatividade no aproveitamento de matéria-prima

Quem tem se dedicado à produção de artesanato e ensinado a outros moradores da Aldeia Recanto Verde é o jovem casal Iri e Fátima Nukini. Os dois recolhem matéria-prima da floresta para elaborar colares, brincos, cocares, tipis (para soprar rapé) e muitos outros acessórios.

Casal de artesãos Iri e Fátima Nukini. Foto: Marcos Santos

Iri é professor de uma escola estadual e está se formando na Ufac, em Licenciatura Indígena, na área de linguagem e arte. Desde criança aprendeu a fazer artesanato com sua mãe, que produzia colares, cestas, pulseiras, cerâmica e fiava linha de tucum.

“O artesanato traz uma força que emana alegria e fortalece a identidade cultural do povo Nukini. Esse trabalho vem se aperfeiçoando dentro dos nossos conhecimentos tradicionais e transmite paz para vivermos em harmonia com a natureza. Me aperfeiçoei muito dentro da força espiritual dos nossos rituais e quero mostrar, com o artesanato, que é possível sermos um povo vivo”, relata.

Fátima aprendeu com Iri o artesanato e os dois se uniram para desenvolver essa arte. “Quando comecei a tomar ayahuasca vinham nas mirações formas que me inspiravam para fazer artesanato. Nas visões eu via os modelos e cores para trabalhar com as penas dos pássaros. Então comecei a aproveitar as penas de araras e papagaios que eu encontrava na floresta na época da mudança de plumagem dos pássaros e também quando os parentes indígenas caçavam essas aves para comer. Mas sob hipótese nenhuma matamos pássaros apenas para aproveitar as penas”, conta Fátima.

Os Nukini trabalham também com bambu e diversas palmeiras da floresta, além de dentes de animais como onça e queixada. As peças produzidas por Fátima começaram a ser vendidas pela internet numa página no Facebook e ganharam o mundo.

Artesanato é comercializado pela internet. Foto: Marcos Santos

“Nós temos a experiência de que é possível viver da produção de artesanato. Agora mesmo estamos produzindo uma remessa grande para mandar para os Estados Unidos. É um trabalho agradável, que fazemos meditando, como uma terapia mental. Para nós cada peça representa uma proteção porque em cada detalhe existe um significado. Também é um marco da força positiva afirmando o nosso povo como uma nação que não desiste da luta”, ressalta Iri.

A retomada das tradições ancestrais

Só na aldeia Recanto Verde atualmente são 14 famílias que praticam o artesanato. O cacique-geral das seis aldeias Nukini, Paulo Francisco Rucam, é um incentivador da atividade. “O artesanato Nukini tem evoluído bastante e trazido muitos benefícios para o nosso povo. Assim, se tornou uma fonte de recursos financeiros importante para as nossas comunidades. Também utilizamos essas peças artesanais em nossos rituais espirituais e festas. O artesanato incentiva as pessoas a trabalhar sem destruir a natureza”, pondera o cacique.

O aspecto sustentável da atividade artesanal é importante para a preservação da terra indígena Nukini, que tem cerca de 27 mil hectares. “Andando nas matas, as pessoas conseguem colher o material para produzir as peças que utilizamos na nossa cultura. A tradição do artesanato é uma herança dos nossos ancestrais, assim como as pinturas, os cocares e os instrumentos musicais. Tudo veio do passado para a nova geração fortalecer a nossa cultura”, salienta Rucam.

O povo Nukini atravessou um período difícil em que se afastou da sua cultura ancestral indígena. Mas já há alguns anos a retomada das tradições tem sido o principal ponto de sustento do Povo da Onça. “Esse retorno à nossa cultura é muito importante, porque a gente vê que o nosso planeta passa por dificuldades em controlar os impactos ambientais. Com essa retomada, temos a visão de fortalecer a nossa espiritualidade, o que é bom para amenizar esses impactos. Assim pretendemos entregar uma floresta viva e saudável para as nossas novas gerações viverem”, reflete o Cacique.