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Kika Sena é a primeira mestra travesti da Ufac

Kika Sena é a primeira mestra travesti da Ufac

A pesquisadora Kika Sena é a primeira mulher trans mestra pela Universidade Federal do Acre (UFAC). A defesa da dissertação, no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas (PPGAC/UFAC), aconteceu nesta quarta-feira, 20 de setembro, reunindo a comunidade acadêmica, familiares, amigos e amigas de Kika, que foram agraciados com o livro de poesias Periférica, sua última obra lançada em 2017.

O estudo “Béééééééé! A voz como recurso poético e político na performance de uma travesti preta e periférica” foi orientado pela professora dra. Adelice dos Santos Souza, e traz a voz como um recurso político para denunciar as violências sofridas pelas travestis, numa dissertação que foge ao padrão acadêmico, incluindo versos e poesias que questionam e desafiam o sistema. Para a pesquisadora, ao refletir sobre os lugares de fala e de escuta, também pode dar voz a outras pessoas trans e, principalmente, abrir um espaço para essas vozes dentro da universidade.

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“Tenho a consciência de que a academia necessita de conhecimentos produzidos por pessoas trans para pessoas trans.
Essa leitura social inexiste e quero contribuir na busca por esse conhecimento socialmente mais engajado”, explica Kika sobre sua metodologia de trabalho, lembrando que o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo pelo 14º ano seguido.

Ainda que a universidade tenha ampliado suas formas de acolhimento, a valorização da produção acadêmica e científica realizada pelas pessoas trans é um desafio a ser superado.

“A universidade, por vezes, aceita nossos corpos, mas não as nossas ideias e epistemologias. Por isso, há de se refletir sobre a universidade que temos e a que queremos. Estarmos nesse espaço de uma maneira mais propositiva é uma forma de transformá-lo, no sentido de torná-lo mais acolhedor, de fazer com que o contexto acadêmico encare novos sujeitos protagonizando esse lugar”.

Em 2018, uma pesquisa da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) apontou que pessoas trans representavam apenas 0,1% de todas as matrículas no ensino superior público, ou seja, a conquista de Kika Sena, além de transgressora do sistema, é inspiradora.

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Kika Sena, a Sereia Vulcânica
Nascida na cidade de Marechal Deodoro, em Alagoas, filha de mãe solteira e semianalfabeta, viu nos estudos a única forma de sair daquele ciclo de miséria. Aos 15 anos, partiu rumo a Brasília para morar com a família de um tio e cursar o ensino médio. Os anos que se seguiram foram de muitos aprendizados e descobertas no mundo do teatro.

Sua entrada no curso de Artes Cênicas na Universidade de Brasília (UnB) foi triunfal, uma grande vitória para a primeira pessoa da família a ingressar em uma universidade pública. “Temos que ressaltar a importância não só das cotas, mas também das bolsas. Dentro da UnB, eu consegui estudar graças às bolsas de assistência estudantil. Diziam que eu tinha altas habilidades, mas eu me esforçava tanto que acho que era só esforço mesmo”, relembra Kika.

Ainda na UnB, Kika começou o mestrado, mas foi convidada para gravar o filme “Noites Alienígenas” (um dos indicados a concorrer ao Oscar 2023). O diretor, Sérgio de Carvalho, ficou encantado com seu desempenho no Campeonato de Slam, em Brasília, e a convidou para vir ao Acre para as gravações.

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No Acre, Kika apaixonou-se por Sara Bicha, então estudante de Artes Cênicas. Do namoro, nasceu Kaê. Essa união de atrizes, produtoras, escritoras, poetisas, mães, travestis, bissexuais resultou em mais trabalhos e no retorno de Kika ao mestrado, que hoje conclui com sucesso.

“Sara foi muito importante para minha retomada do mestrado, porque é muito difícil sem apoio da família e, mais uma vez, destaco a importância das bolsas. Sem os auxílios, não seria possível voltar aos estudos. Neste momento final, estou muito feliz e aliviada de concluir mais esse ciclo da minha vida”, desabafa.