Família de Geraldo Braga da Cunha, da Assembleia de Deus, afirmou que ela era "tratada como se fosse uma filha" e que o relacionamento era "consensual". Empregada disse que tinha "nojo" do pastor
Pastor da Assembleia de Deus, Geraldo Braga da Cunha é acusado de ter mantido por 32 anos uma mulher em trabalho análogo à escravidão em Mossoró (RN). Segundo o Ministério do Trabalho e Previdência, a mulher chegou ao local ainda adolescente, com 16 anos, e sofreu abuso e assédio sexual do empregador.
Responsável pelos serviços domésticos da casa, ela recebia em troca moradia, comida, roupa e alguns presentes, porém nunca teve salário ou conta bancária. Além disso, não tirava férias nem interrompia os afazeres aos finais de semana.
A denúncia de trabalho escravo chegou ao Ministério do Trabalho e Previdência através da conta @trabalhoescravo no Instagram, mantida pelo Instituto Trabalho Digno. Uma fiscalização foi enviada ao local e considerou a ocorrência de trabalho forçado, condições degradantes e jornadas exaustivas.
Usando uma narrativa absurda – porém comum – entre as pessoas que exploram funcionários, a família, que consiste no pastor, na esposa e nos quatro filhos, afirmou que a mulher não era escravizada já que era tratada “como se fosse uma filha” desde que chegou à casa.
No entanto, o casal nunca cogitou uma adoção formal dela. O pastor chegou a avaliar, há alguns anos, que fosse pago um salário a ela, o que não aconteceu. O INSS foi recolhido durante algum tempo, o que contribuiu para o reconhecimento de vínculo trabalhista.
“A despeito de uma filha também ajudar nas tarefas domésticas, a vítima prestava um serviço diário, cuidando da casa e ajudando na criação dos filhos do casal”, afirmou a coordenadora da operação, Marina Cunha Sampaio, que coordenou a ação em Mossoró.
Abusos e assédios sexuais duraram 10 anos
Além disso, o Geraldo Braga afirmou que o relacionamento era “consensual”, apesar da empregada ter dito que tinha “nojo” do empregador e que fugia dele na casa. Os abusos e assédios sexuais teriam durado dez anos. A família também sabia que isso ocorria, mas manteve as aparências.
“Ela não teria como consentir ou não com relações sexuais porque estava na situação vulnerável de alguém que é reduzido à condição análoga à de escravo. Consideramos que foram relações de abuso”, afirma a coordenadora da ação.
“A empregadora ainda disse que perdoava a trabalhadora por conta da relação com o marido, ignorando a situação de exploração ao qual ela a submetia”, continua.
Os salários atrasados e verbas rescisórias foram calculados em cerca de R$ 88 mil – parte da dívida já prescreveu. Além disso, o Ministério Público do Trabalho pediu R$ 200 mil em danos morais individuais para Maria, valor condizente com a baixa renda da família.
Pastor nega as acusações
Os advogados do pastor chamaram a situação de “pseudo caso de escravidão doméstica e abuso sexual” e negaram com veemência as acusações.
Segundo a defesa, a fiscalização levou à imprensa “informações manipuladas que interessam apenas a quem acusa”, promovendo uma “ação midiática” em “data convenientemente próxima ao Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo” – que foi celebrado no dia 28 de janeiro.
* Com informações de Leonardo Sakamoto e Piero Locatelli, do UOL