Para especialistas, teles estão reforçando o discurso de que as empresas de internet devem compartilhar custos de investimento nas redes. Em outros países a discussão avança
Os pacotes que permitem tráfego ilimitado para aplicativos como WhatsApp podem estar com os dias contados, de acordo com fontes do setor, teles e especialistas. A informação foi publicada primeiro pela Folha de SP.
A polêmica ganhou novo capítulo em junho deste ano, quando o presidente da Claro Brasil, José Felix, classificou a estratégia como um erro por parte das companhias de telecomunicações. Em entrevista recente, um executivo da Vivo disse que a companhia tem diminuído a oferta de aplicativos com dados ilimitados, já que existe a necessidade de investimento feito na rede.
Para fontes do setor, o tema está ganhando força nas companhias no Brasil conforme o tema avança em outros locais no mundo. Na União Europeia, por exemplo, há uma discussão por parte dos órgãos de concorrência em obrigar as empresas de aplicativos (chamadas de OTTS, como Facebook, Netflix, TikTok, entre outas redes sociais e de streaming) a dividirem os custos de investimentos em rede com as empresas de telecomunicações.
A divisão de investimentos entre as empresas de telecomunicações e as OTTS está nesse momento na chamada fase de "tomada de subsídio" na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Essa fase é uma espécie de pré-consulta pública com perguntas e reflexões, sem um texto formatado. É tido com uma espécie concepção do regulamento.
Na década passada, houve denúncia ao Cade, que regula a concorrência no Brasil, de que "zero rating" feria a neutralidade de rede, quando todos os consumidores têm de ter acesso igualmente a velocidade de internet sem discriminação. A Anatel e o Ministério das Comunicações afirmaram na ocasião de que a prática não feria o marco civil da internet e deveria seguir de acordo com a estratégia de cada companhia.
Atualmente, a Claro, por exemplo, oferece, sem descontar do volume de dados da franquia, para pacotes controle e pós-pagos acesso ilimitado a aplicativos como WhatsApp e Waze. Para os planos mais robustos, há ainda o o chamado "zero rating" para Twitter, Instagram, Facebook e TikTok.
Quem também ainda aposta fortemente nessa estratégia é a TIM, com acesso ilimitado ao WhatsApp. No caso do Instagram, Twitter, Facebook e Messenger, o benefício vale apenas por três meses sem descontar da franquia nos planos controle. Porém, nos planos pós-pagos, o acesso ilimitado não tem período pré-estabelecido.
Já a Vivo é a menos agressiva. Hoje, a operadora oferece acesso ilimitado apenas para o WhatsApp em seus planos. Um dos caminhos que as empresas vêm fazendo é criar pacotes já em parceria com as empresas de streaming, como Amazon Prime, Globoplay, Spotify e Netflix. Porém, essa parceria limita o total do tráfego de dados dentro dos pacotes de internet móvel.
Entre os planos pré-pagos (cartão), o WhatsApp é o único aplicativo ilimitado aos clientes. O executivo de uma das teles afirmou que a mudança vem sendo gradual de forma a fazer uma "transição suave". Ele destacou que a expectativa é iniciar o fim de aplicativos ilimitados nos planos pós-pagos e controle. Já no pré-pago, a mudança deve ocorrer em um segundo momento, ainda sem data.
Para Ari Lopes, da consultoria Ovum, as teles estão reforçando o discurso de que as empresas de internet devem compartilhar os custos de investimento nas redes:
- O problema é que as próprias teles não cobram nada dos clientes para acessar esses apps, então elas mesmas enfraquecem o argumento.
Por isso, eliminar o acesso gratuito faria parte da estratégia delas de conseguir que as big techs paguem pelo investimento na rede.
O analista Andre Gildin, da RKKG Consultoria, lembrou que o acesso ilimitado ajudou as operadoras a popularizarem o uso de dados e incentivar a migração de clientes para o modelo pós-pago. Por outro lado, disse ele, ajudou os próprios aplicativos a massificar o seu uso.
- Mas esse modelo suscita a discussão de quem paga a conta. Eu acredito que, com a introdução do 5G, as operadoras vão, gradativamente, segregar mais os planos pós-pagos, oferecendo uma diferenciação na velocidade e quantidade de tráfego, o que inclui ter ou não limitação do uso de apps, como o whatsapp . Claro que acabar esse modelo de uma vez não será fácil, mas faz sentido em um modelo de diferenciação por qualidade.