A Operação Mitocôndrias, deflagrada no início de abril pela Polícia Civil do Acre revelou um esquema de fraude no Departamento de Merenda Escolar da Secretaria de Educação, Cultura e Esporte (SEE) que poderia causar uma prejuízo de R$ 20 milhões aos cofres públicos do estado.
Enquanto crianças e adolescentes pobres viam na merenda da escola a única refeição do dia, a polícia acredita que um grupo formado por servidores públicos e empresários arquitetaram um verdadeiro conluio regado a metodologias para desviar recursos que seriam para o pagamento dos produtos licitados.
Na lista dos alvos, três empresários. Dois deles ligados diretamente ao deputado estadual Manoel Morais: um filho e o cunhado. Poucos dias após a prisão temporária, que levou sete para a cadeia, a polícia disse à Justiça que os alvos já poderiam ser soltos, uma vez que o objetivo das prisões já havia sido alcançado.
Em meio às licitações dispensadas, com valores milionários, à época assinados pelo ex-secretário da SEE, Márcio Mourão [exonerada na última semana sem justificativa pública], os empresários e servidores teriam forjado documentos de controle de entrada e saída das mercadorias, possibilitando pagamentos de produtos jamais distribuídos.
O portal Notícias da Hora teve acesso com exclusividade ao inquérito policial e à denúncia feita ao Poder Judiciário e ao Ministério Público, para tentar derrubar o suposto esquema que estaria causado prejuízo milionário ao Governo do Acre. As informações da polícia são didáticas e remontam a metodologia que teria sido adotada pelo grupo criminoso.
A investigação foi coordenada pelos delegados Alcino Júnior e Pedro Paulo Bruzolim, da Delegacia Especializada em Combate à Corrupção (Decor) e contou com o auxílio técnico da Controladoria Geral do Estado – CGE, que já havia percebido os problemas na documentação do Departamento de Merenda Escolar e informado isso às autoridades competentes.
“Por meio de minuciosa auditoria nos contratos e documentos, no que tange aos meses de novembro e dezembro de 2019, concomitante à investigação policial, restou comprovado, preliminarmente, a prática de diversas infrações penais e administrativas, perpetradas pelos representantes das empresas M. M. Silva Comercio e Serviços Ltda, Cooperativa o Juruá – Cooperjurua, C Silva de Sales e Fricarnes Distribuidora – Eireli”, diz a denúncia apresentada à Justiça.
Os delegados também alegaram ao Poder Judiciário que três servidores ligados ao departamento eram os principais que auxiliavam no suposto esquema. A investigação corre em segredo de justiça, portando os nomes dos servidores serão divulgados apenas pelas letras das iniciais, contudo, as funções que exerciam serão expostas normalmente.
“Além da coautoria e auxílio direto dos servidores públicos A.C.S.A., ex-gerente geral da merenda escolar, O.A.T., ainda na função de coordenador do armazém, e o nacional M.S.S.L., ex-assistente financeiro”, diz a denúncia. Na lista das irregularidades, a polícia é bastante descritiva, tudo para não deixar dúvidas sobre os crimes e infrações administrativas praticadas pela equipe.
Lista de irregularidades percebidas durante a investigação da polícia e fiscalização da Controladoria Geral do Estado
“Além da coautoria e auxílio direto dos servidores públicos A.C.S.A., ex-gerente geral da merenda escolar, O.A.T., ainda na função de coordenador do armazém, e o nacional M.S.S.L., ex-assistente financeiro”, diz a denúncia. Na lista das irregularidades, a polícia é bastante descritiva, tudo para não deixar dúvidas sobre os crimes e infrações administrativas praticadas pela equipe.
As irregularidades foram confirmadas por uma das testemunhas ouvidas pela polícia civil. A servidora I.S.P.N., que atuava no setor como assistente administrativa, mas não fazia parte do suposto conluio, sendo apenas orientada pelos servidores já citados, pois na cadeia da hierarquia estava abaixo deles. Os fatos foram comprovados por meio de registros de e-mails e documentos criados em séria para confundir a polícia.
Segundo o depoimento de I.S.P.N., a chefe dela, ex-gerente da merenda escolar, A.C.S.A., mudou de comportamento após a chegada de um novo servidor comissionado, o hoje coordenador da merenda, Mauro Sérgio Moura, que, mesmo sem nomeação, já fiscalizada todos os atos praticados no local informalmente. A assistente do setor contou detalhes sobre como A.C.S.A. passou a atuar.
“A partir de então, o clima de desconfiança iniciou no local. Que ainda na primeira quinzena de janeiro de 2020, A.C.S.A. procurou a depoente e passou instruções para que a mesma formalizasse pedidos de produtos de acordo com notas fiscais já emitidas e atestadas. Que, neste período, também recebeu ordem direta de A. para que produzisse os recibos dos produtos fazendo com que as datas coincidissem, isto é, pedido, recibo e nota fiscal”, diz o trecho do depoimento.
Ainda segundo a investigação policial, a testemunha chegou a receber do coordenador do armazém O.A.T., por e-mail, sob a ordem da então gerente da merenda, um modelo de recibo que deveria ser utilizado para todos os processos em que não havia. Era uma forma, segunda a polícia, de maquiar a real prática executada pelos servidores junto às empresas.
“Que o modelo de pedido a depoente já tinha no seu computador, uma vez que auxiliava nos pedidos a mando de A. e M.S.S.L.. Que, segundo a depoente, após preparar todos pedidos solicitados, os documentos foram impressos e A. e M.S. assinaram. Que os recebidos correspondentes foram assinados por O. de A. T.. Que, segundo a depoente, tanto O. quanto M.S. tinham total ciência do que estava sendo feito”, completa a denúncia dos delegados à Justiça.
A assistente, percebendo que algo poderia ser questionado no futuro, decidiu salvar todos os documentos que estavam sendo feitos em uma pasta no computador que utilizada. Justamente esses documentos, com data de criação e alteração, foram entregues à polícia. Arquivos e e-mail que comprovam o objetivo do grupo de servidores.
Arquivos continham a indicação de quantidade de produtos, destino e valor, para fazer frente às notas fiscais já emitidas e atestadas, apontando pelo menos três empresas especificas: M. M. Silva Comercio e Serviços Ltda, Cooperativa do Jurua e C Silva de Sales
Negócios em família: polícia coloca em xeque ligação entre empresários
As investigações da Polícia Civil do Acre levaram a uma revelação um tanto curiosa: os empresários investigados compõem o mesmo grupo familiar. Um total de três empresas cujos membros dos quadros societários se conectam entre si, e para a polícia, não foi difícil criar um verdadeiro organograma dos negócios em família. E isso fica claro na denúncia.
“Ao aprofundarmos a análise específica das 03 (três) pessoas jurídicas citadas, assim como seus respectivos quadros societários e administradores, é possível constatar um verdadeiro entrelace de sócios dentro de membros de uma mesma família, sendo assim um verdadeiro grupo que se beneficia de contratos de fornecimento de merenda escolar para o Estado do Acre”, alegam os delegados Alcino Júnior e Pedro Paulo Bruzolim.
Organograma montado pela polícia esclarece como é a relação e ligação dos empresários e administradores das empresas; Filho, esposa e cunhado do deputado Manoel Morais aparecem