Na terça-feira 5 da semana passada, quando ocupou um dos lugares de honra da mesa no plenário da Assembleia Legislativa do Acre (Aleac), o governador Gladson Cameli (PP) sabia que sua presença ali simbolizava não apenas um gesto da relação harmônica entre os Poderes, prevista na Constituição.
Ver o seu cunhado, o progressista Nicolau Júnior, na cadeira de presidente do Parlamento acreano também representava o claro sinal de que o Palácio Rio Branco só tinha conquistado tal êxito, graças ao consenso entre os deputados da base e da oposição - sobretudo da oposição.
Não fosse a atuação republicana dos parlamentares eleitos em outubro último pela hoje demonizada Frente Popular do Acre (FPA), Gladson Cameli talvez nem mesmo saísse do gabinete na avenida Brasil e fosse até a Arlindo Porto Leal para fazer a leitura da mensagem governamental.
As chances de um vexame ao não ver a cadeira da presidência ser ocupada pelo nome que ele queria, não estavam de todas descartadas ante a total falta de um comando central político por parte do Palácio Rio Branco capaz de debelar possíveis rebeliões internas.
Nos bastidores, o governo enfrentava sérias dificuldades nas negociações políticas dentro de sua própria base para a composição da nova Mesa Diretora. A guerra pelo comando do Parlamento estadual começou ainda na noite do dia 7 de outubro, ao encerrar das apurações do primeiro turno.
A principal resistência estava no MDB, insatisfeito ao ver a primeira-secretaria ficar com o tucano Luiz Gonzaga.
Os emedebistas (entenda Roberto Duarte) queriam a cadeira por, segundo eles, ter sido prometida pessoalmente por Gladson Cameli em troca do partido abrir mão de disputar a presidência da Casa. Por ter eleito a maior bancada e os deputados mais bem votados, Duarte e uma parte do MDB evocavam o direito tradicional, dentro dos parlamentos, de esse resultado assegurar à legenda o comando.
Enquanto o cabo-de-guerra se desenvolvia, outras candidaturas à presidência iam tentando ganhar fôlego com base na insatisfação do MDB, e fazendo acenos de espaços privilegiados na estrutura da Aleac aos parlamentares da oposição. O que não se tinha na ponta do lápis é que os oposicionistas já estavam fechados com Nicolau Júnior.
Todo esse processo foi liderado pelo experiente Edvaldo Magalhães (PCdoB), que entre 2007 e 2010 foi presidente da Aleac. Antes, tinha sido líder dos governos Jorge Viana (1999-2006). Os cabelos brancos que se misturam com aqueles que insistem em ficar preto, mostram que o comunista conhece como poucos como funcionam as coisas dentro do Parlamento.
A comuna articulação
Habilidoso, Magalhães sabia que, se quisesse, a FPA poderia ficar com os melhores cargos e espaços caso patrocinasse uma candidatura com os insatisfeitos do governo Cameli. O grupo, que por 20 anos teve a hegemonia política do Acre, elegeu 11 deputados estaduais. Com apenas mais dois votos, assegurava até a presidência da Casa.
Até aquele momento, todos ainda eram oficialmente oposição. Em tempos de vacas magras, o Palácio Rio Branco não teve condições de abrir o balcão de negociações para o toma-lá-dá-cá, a fim de arrebanhar parlamentares eleitos pela antiga FPA. Porém, Edvaldo Magalhães e seus demais aliados preferiram não quebrar a tradição de formar uma Mesa plural, baseada no tamanho de cada partido.
Essa composição, por sinal, foi iniciada a partir dos governos Jorge Viana, acabando com negociações escusas que ocorriam pelos corredores e banheiros da Casa para comprar apoio político pela presidência da Mesa.
Edvaldo Magalhães, praticamente, assumiu as negociações pela oposição - e de quebra pelo governo -, colocando as suas propostas para análise de Nicolau Júnior. Ele sabia que a presidência e a primeira-secretaria estavam fora de cogitação, cabendo ao seu grupo ficar com espaços mais modestos entre os nove disponíveis na Mesa Diretora.
Assim foi: emplacou o PCdoB na primeira vice-presidência e o PT na terceira-secretaria. O fechamento desta composição dias antes de os parlamentares voltarem do recesso foi a gota d’água para aqueles que ainda tinham esperanças de contar com a oposição para uma surpresa de última hora na eleição.
O gesto de Edvaldo Magalhães não significa que nem ele nem o PCdoB vão soltar beijos para o Palácio Rio Branco, fazendo uma oposição de faz-de-conta. Como ele tem dito, sua atuação foi em favor de um Parlamento coeso e forte, com a pluralidade partidária se fazendo prevalecer.
É graças a esse tipo de pensamento republicano que o governador Gladson Cameli teve a segurança de que um aliado de sua extrema confiança estará no comando do Poder; um Poder capaz de causar muitos problemas ao Executivo.
Diante disso, Cameli deveria convidar PCdoB e PT para um café na agora casa azulada, demonstrando que um governo forte se faz respeitando e dialogando com todas as diferenças - e não as solapando. E que tal gesto não significa que sua gestão é petista ou comunista.