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POLÍTICA

Governadores, Congresso e Judiciário atuam por reajuste dos próprios salários

Governadores, Congresso e Judiciário atuam por reajuste dos próprios salários

Na reta final do ano legislativo, governadores e congressistas, às vésperas de novo mandato, têm se articulado para encontrar espaço no já espremido Orçamento de 2023 em busca de reajustes de seus próprios salários. O Judiciário também debate aumento, já chancelado pelo Supremo Tribunal Federal. Em São Paulo, a Assembleia Legislativa aprovou reajuste de 50% na remuneração do governador eleito Tarcísio de Freitas (Republicanos) e, na Bahia, os deputados estaduais deram 49% de aumento para Jerônimo Rodrigues (PT). A alta nos contracheques deve se repetir em pelo menos em outros três estados: Rio, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, onde já há negociação com os parlamentares.

As discussões vão no lastro de um projeto aprovado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em agosto — e que aguarda discussão no Congresso — de aumento de 18% na remuneração dos magistrados, além da votação da PEC do Quinquênio, que pode ser pautada no Senado ainda este ano.

No Legislativo federal, deputados e senadores também avaliam incremento em seus vencimentos e miram o teto atual dos ministros da Suprema Corte, que é de R$ 39,3 mil. Para analistas, o pacote de aumento nos três Poderes terá impacto bilionário no Orçamento de 2023, afetando o país e estados que já estão em crise fiscal.

Em São Paulo, com o reajuste aprovado ainda em novembro, o governador eleito Tarcísio receberá um salário bruto de R$ 34,5 mil. Até então, a remuneração de um governador paulista era de R$ 23 mil mensais. O projeto foi aprovado com folga na Alesp, com o apoio de 56 deputados; seis votaram contra.

Já a decisão que beneficiou o baiano Jerônimo Rodrigues é mais recente. Na última terça-feira, a assembleia decidiu que, a partir de 2023, o governador eleito passará a receber R$ 11,5 mil a mais do que o salário atual, de R$ 23,5 mil, chegando a um total bruto de cerca de R$ 35 mil. A medida também vai aumentar os rendimentos do vice-governador eleito, Geraldo Júnior (MDB), além de secretários estaduais.

O maior reajuste em debate neste momento, no entanto, beneficiaria o governador eleito de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL). Na Assembleia Legislativa do estado, seus aliados trabalham para aprovar, nos próximos dias, um aumento de 125%: o atual salário de R$ 15 mil chegaria aos R$ 33,7 mil, em proposta que também prevê aumento substancial — de cerca de 80% — para secretários estaduais, que hoje recebem R$ 14 mil.

Já o governador reeleito do Rio, Cláudio Castro (PL), aguarda definição na Alerj. Nos bastidores, a expectativa é que até o último dia de expediente este ano na Casa seja votado um reajuste de mais de 60% para todo o primeiro escalão do estado. Se isso ocorrer, o salário de Castro salta de R$ 21,8 mil para cerca de R$ 35,4 mil reais — o que o colocaria entre os cinco governadores mais bem remunerados do país.

Apesar de chefiar um dos estados menos populosos do Brasil, Gladson Cameli (PP), reeleito no Acre, é quem lidera a lista dos governadores com maiores salários. Ele recebe uma remuneração bruta de R$ 35,8 mil.

Outro nome que aguarda definição entre os deputados estaduais é o governador eleito para mais um mandato no Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Com salário atual de R$ 25,3 mil, ele acompanha a articulação de interlocutores com a cúpula da Casa, que pode levar seus vencimentos a R$ 35,4 mil, teto do estado pago a um desembargador do Tribunal de Justiça.

O menor salário da lista é o do chefe do Executivo de Pernambuco: R$ 9,6 mil, menos do que recebe um secretário (R$ 12,2 mil), valor vigente desde 2002. Mas a governadora eleita Raquel Lyra (PSDB), como é procuradora do estado, recebe R$ 42,1 mil mensais, e deverá optar por manter essa remuneração. A prática já é adotada pelo atual governador Paulo Câmara (PSB), que quis seguir recebendo como auditor concursado do Tribunal de Contas do Estado.

Novo teto em análise

Na Câmara, um projeto de lei enviado pelo STF e parado desde antes das eleições propõe novo reajuste nos salários de ministros do Supremo. Se aprovado pelo Congresso, o PL elevaria o teto constitucional da administração pública de R$ 39,3 mil, como está hoje, para R$ 46,3 mil. O aumento foi unânime em votação no STF e propõe divisão em quatro parcelas de 4,5%, a partir de abril do ano que vem e com fim em julho de 2024.

Outro projeto, também enviado pela Corte à Câmara em agosto, prevê o mesmo percentual de incremento (18%) aos servidores de carreira do Judiciário — o aumento mais recente aos magistrados aconteceu em novembro de 2018 e, nesse período, a inflação acumulada supera os 24%.

Se avançar, o impacto da medida, conforme cálculos da Instituição Fiscal Independente, ligada ao Senado, seria em torno de R$ 1,8 bilhão no Orçamento de 2023, já que a correção no salário dos ministros do Supremo também altera o dos demais magistrados do Judiciário, que têm remuneração atrelada à dos membros da Suprema Corte. O STF afirma, porém, que tais reajustes serão pagos com valores remanejados do próprio Judiciário, sem necessidade de novos repasses. Na ocasião em que aprovou os 18% de aumento, a Corte pediu reajuste do Orçamento do STF para R$ 850 milhões em 2023, frente a R$ 767 milhões. A elevação corresponde à inflação.

Há ainda a possibilidade de voltar a ser pautada no Senado nos próximos dias a PEC do Quinquênio, que propõe bônus de 5% a cada cinco anos a magistrados e membros do Ministério Público — penduricalho extinto em 2016. A proposta, que tramita há nove anos, inclui retroatividade, além de aposentados e pensionistas, e pode dar reajuste de até 35% para alguns magistrados, já que está livre do teto constitucional. Apesar de o texto apresentado no Congresso não incluir estudo sobre o impacto financeiro, o que levou a proposta a ser retirada da votação, estimativas avaliam que ela poderia trazer custo anual de outros R$ 5 bilhões ao orçamento da União.

Deputados e senadores discutem aumentos em seus próprios salários e no de servidores do Congresso. O reajuste elevaria os rendimentos dos parlamentares de maneira escalonada, de R$ 33,7 mil, o valor atual, para cerca de R$ 46 mil até 2026. Para o ano que vem, os rendimentos seriam de 39,3 mil. A discussão, que ainda não tramita oficialmente, pode ser votada até o recesso parlamentar. O argumento usado é de que o último reajuste aconteceu há oito anos e, nesse período, a inflação acumulada é de 57%, segundo o Banco Central. 

Para o fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, as iniciativas são “absolutamente inoportunas e descabidas”, no momento em que as discussões orçamentárias buscam espaço para pagar R$ 600 do Bolsa Família, o que vai custar ao país aproximadamente R$ 150 bilhões:

— Estamos com uma dificuldade enorme de fechar o Orçamento de 2023. Daí surgiu a PEC da Transição, que pode chegar a R$ 205 bilhões, sem que seja apontada uma fonte de recursos e um novo arcabouço fiscal. A situação fiscal do país é delicada, e não faz qualquer sentido que aqueles que recebem os maiores salários dentro das categorias do funcionalismo público estejam pleiteando um aumento.

O pensamento vai ao encontro do que diz Marina Atoji, gerente de projetos da Transparência Brasil. Ela destaca que se os reajustes forem dados, políticas públicas sociais serão prejudicadas: 

— Isso pode aprofundar crises fiscais em estados que já estão em situação precária, como o Rio. No contexto de enorme desigualdade social e crescimento da pobreza no país, medidas como essas intensificam a visão comum de que as autoridades preocupam-se apenas consigo mesmas.