Era esperado que os primeiros 100 dias da gestão Cameli não seriam fáceis, e nem poderiam. Traduzindo o pensamento do liberal irlandês Edmund Burke, o governo não se deu ao luxo de poupar, mas, de escolher a quem pagar primeiro tamanho é o rombo encontrado nas contas públicas. Herdou-se um estado praticamente falido.
Creio que na medida em que o nível de conhecimento de como a roda gira vai aumentando, os resultados se elevam de modo que mesmo em meio a tempestades – a maioria criada pelo Diário Oficial – o governador passará um domingo de páscoa se não triunfante, pelo menos mais aliviado.
Com a publicação do rito de contratação dos 517 novos profissionais da segurança pública na última terça-feira (16), centenas de famílias terão a certeza de uma vida nova exatamente na semana de Páscoa. Parece pouco, mas se pensarmos que nas últimas décadas não se falou mais em contratação efetiva, veremos que é um sinal de esperança.
Mesmo com pouco mais de 100 dias já existem sintomas de austeridade. E nesse quesito permitam-me abrir aspas para o “trio do Malheiros” que foi o mais criticado até o momento, mas responsável pelo fôlego dado ao Estado para antecipar contratações. Se não fosse o equilíbrio fiscal, cortes de cargos comissionados, fusão de pastas, esforço na arrecadação de impostos, taxas e contribuições, não se pagaria fornecedores, décimo terceiro. O Grupo Permanente de Planejamento Estratégico, o GPPE, tem sua contribuição. O secretário da Casa Civil, Ribamar Trindade, caprichosamente fez o dever de casa.
Tudo bem que o GPPE cometeu algumas baianadas – talvez empolgado com o discurso do agronegócio ou da chamada rondonização. A reforma da reforma política que chegará ao parlamento na próxima semana, exemplifica muito bem esse detalhe. “Ninguém é dono da verdade” sempre adverte o governador.
O bom é que no momento certo, pressionado ou não, Cameli foi competente para entrar em campo, bater na mesa e dizer: “aqui quem manda é o governador. Os políticos somos eu e o Rocha”.
Tenho dito sem medo de errar que aos poucos “o menino” do Juruá vai imprimindo o seu DNA na gestão pública. A grande inovação embora ainda não seja tecnológica, é no campo ético. Jornalistas que participaram da avaliação dos 100 dias no 1º piso do Palácio Rio Branco, nem tiveram tempo para reclamar do sistema de ar-condicionado quebrado, saíram elogiando a postura republicana do governador.
A liberdade de expressão escancarada no estilo Gladson Cameli, mal compreendida por aliados que esperavam um início de gestão avassaladora de “caça às bruxas”, com prisões, discurso de ódio, perseguição e cores partidárias falando mais alto do que a necessidade de a máquina pública funcionar, é o assunto mais comentado entre o quarto poder (a imprensa) e até no parlamento.
O jeito simples do ex-senador se comunicar, despachando no banco da praça sem forte esquema de segurança, indo ao rádio receber ao vivo críticas e elogios a sua gestão, é o tema do senadinho, das rodadas de tereré, da fila do banco.
Não é à toa que o petista mais vermelho do parlamento, deputado Daniel Zen, vem moderando seu discurso e pedindo mais tempo para cobrar resultados desse governo. Zen sabe o tamanho do abacaxi que o governador recebeu. Todos de mente mais sadia e equilibrados, pensam da mesma forma.
Cameli conta ainda a seu favor, com a fidelidade do vice-governador Major Rocha que tem se comportado com excelência, mostrando que o Acre está acima das picuinhas. E olha que não faltaram incursões, muitas ressuscitadas à cada nomeação de alguém que não balançou a bandeira de sol a sol.
A necessidade de despetização não poderia ser uma prioridade nos 100 dias de governo. Cameli já determinou aos seus subordinados, remanejamentos e até renomeações de quem não se perfilar em sua forma de governar. Creio que nesse novo momento, os que defendem outra lógica, outro sistema político, sejam convidados a sair.
Muitas lições devem ser tiradas desses primeiros 100 dias. O governo trocou seu porta-voz, mas ainda precisa ensinar muitos de sua equipe a dialogar; devido a egos, enfrentou derrotas na base de sustentação política, mas nenhum temporal que pudesse abater o alicerce. Nenhum fato manchou a austeridade dessa gestão até aqui sem sinais de corrupção.
A Semana Santa é um bom momento para uma reflexão mais profunda do que virá pela frente. É hora de aprimorar o relacionamento com o setor produtivo, criar um ambiente favorável aos negócios e investimentos para que a geração de emprego e renda possa ressurgir com força total.
Essa parece ser uma receita agradável. A retomada do crescimento não acontecerá a curto prazo, a paciência ainda será um grande exercício público e um dever de todos, os que estão no poder e os que dependem do poder.
Como exigir paciência de um líder intempestivo e ansioso? O próprio governador tem dado essa resposta quando diz: “Estou amando ser governador”. Seu bom humor e tanto otimismo, serão capazes de criar as condições para a mudança.