A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, propôs ao Supremo Tribunal Federal (STF) dez ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) contra normas estaduais e distrital que permitem o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência a procuradores dos estados e do Distrito Federal (DF). São questionadas leis estaduais aprovadas nos seguintes estados: Acre, Amapá, Bahia, Maranhão, Rio de Janeiro, Pará, Pernambuco, Sergipe, Tocantins e Distrito Federal. Com essas ações, já 13 as normas questionadas por meio de ADIs propostas pela PGR. Em todas, o principal argumento apresentado é o de que os honorários recolhidos pela parte vencida em processos judiciais contra os entes públicos devem ser compreendidos como receita pública, não podendo ser destinados a advogados e procuradores que atuaram nos casos.
A primeira ação foi protocolada em dezembro do ano passado e tem como objeto a Lei 13.327/2016, que permitiu o pagamento desse tipo de verba a advogados públicos que defendam a União, as autarquias e as fundações. Em maio deste ano, foi ajuizada ação contra o pagamento a procuradores de Goiás. Nas ações enviadas ao STF nesta terça-feira (18) e quarta-feira (19), Raquel Dodge destaca que as normas que permitem o recebimento de honorários a procuradores dos estados e do Distrito Federal são incompatíveis “com o regime de subsídio, o teto remuneratório constitucional e os princípios republicanos da isonomia, da moralidade, da supremacia do interesse público e da razoabilidade”.
A procuradora-geral aponta que honorários de sucumbência têm nítido caráter remuneratório e de contraprestação de serviços no curso do processo. Segundo ela, essas verbas, uma vez executadas e recolhidas pelo ente público, integram a receita pública. “Não podem ser classificadas, em hipótese alguma, como receita de índole privada, dada a manifesta incompatibilidade com o regime estabelecido em lei para seu recolhimento e distribuição”, assinala.
Nas peças, a PGR observa que a atuação em causas judiciais não constitui ofício estranho às atribuições institucionais de procuradores dos estados e do DF. Para ela, o pagamento de honorários de sucumbência “simplesmente remuneram trabalho ordinário daqueles servidores”. Ainda de acordo com as petições iniciais nas ADIs, o regime de pagamento unitário que caracteriza o modelo constitucional de subsídio – modelo pelo qual é feito o pagamento dos vencimentos dos advogados públicos e procuradores dos estados repele acréscimos remuneratórios devidos em decorrência de trabalho ordinário de agentes públicos.
“Em se tratando de agentes públicos remunerados por subsídio, para que gratificação ou adicional pecuniário seja legitimamente percebido, faz-se necessário que não decorra de trabalho normal, mas possua fundamento no desempenho de atividades extraordinárias, que não constituam atribuições regulares desempenhadas pelo agente público”, pontua a procuradora-geral da República nas ADIs.
Honorários de sucumbência – Os honorários de sucumbência são reconhecidos como parcela remuneratória devida a advogados em razão do serviço prestado. Diferentemente dos advogados privados, que arcam com custos em razão da manutenção de seus escritórios e percebem honorários contratuais, advogados públicos são remunerados por subsídio, “revelando-se incongruente a percepção de parcelas extras, pagas unicamente em razão do êxito em determinada demanda”, explica a PGR.
Dodge sustenta ainda que ao admitir a obtenção de vantagem financeira dissociada dos subsídios pagos aos integrantes da advocacia pública, e vinculada ao êxito numa determinada causa – ainda que parcial, as normas questionadas viabilizam a ocorrência de conflitos de interesse entre o ocupante do cargo de procurador dos estados e do Distrito Federal e os objetivos buscados pelo ente político.
Medidas cautelares – As ações pedem a concessão de medida cautelar (liminar) para suspender imediatamente a eficácia das normas questionadas. Para a procuradora-geral, o perigo na demora está no fato de que as leis impugnadas estabelecem o direito de membros da advocacia pública receberem parcela remuneratória em detrimento dos cofres do Estado. “Além do dano ao erário e da improvável repetibilidade desses valores, por seu caráter alimentar e pela possibilidade de os beneficiários alegarem boa-fé no recebimento, esse pagamento desacredita o sistema constitucional de remuneração por meio de subsídio e gera desigualdade espúria entre agentes públicos”, argumenta Raquel Dodge.